sexta-feira, 30 de maio de 2014

Hoje cedo

Na hora de sair:

- Mamãe, você vai trabalhar?

Eu vi o biquinho. E doeu.

- Eu vou, meu amor. O dia vai passar rapidinho...

E ela caiu no choro. Não era birra, não era graça, não era nada. Era só um choro doído, que foi levando meu coração derretido enquanto descia o rosto dela:

- Mamãe, não vai trabalhar, hoje! Fica comigo! Fica comigo, por favor. Não vai, mamãe.

Fechei ela no meu abraço, apertado. Tentei beijar cada lágrima que eu causava. Ela me olhava esperançosa:

- Fica comigo, hoje?

- Amanhã, meu amor. Amanhã e depois.

O bico voltou.

- E daqui uns dias, duas semanas. Mamãe vai sair de férias! Não é bom? Nós vamos ficar juntas o dia inteiro, muitos dias.

Muitos dias. Nem eu acreditei nessa minha mentira, mas o que dizer a ela? O sorriso não abriu. Ficou me olhando séria.

- Me dá um beijo, meu amor? Mamãe tem que ir...

Ela me abraçou de novo. Me beijou. Quando me soltou e eu cheguei na sala, veio correndo de novo:

- Mamãe! Não vai...! Me dá um beijo.

Fiz a maior covardia que as mães fazem. Me abaixei, olhei nos olhos dela:

- Eu vou te dar um beijo e ele vai te fazer muito forte. E a mamãe vai sair pra trabalhar, e o dia vai passar rapidinho, e eu vou voltar logo logo pra gente ficar juntinho. Tudo bem?

Ela fez um sim que era não, mas fez que sim.

Me deu mais um abraço apertado, eu dei o beijo, e ela voltou resmungando para tomar café.

E o meu pedaço, que sobrou, veio trabalhar. *suspiro*

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Carta para Ana Clara

Já vi algumas cartas em alguns blogs por aí, até no facebook. E aí... por que não? Para quando eu me for, antes disso ou depois, que ela saiba.


Minha luz Ana Clara,

acima de tudo, minha filha, e acima de mim mesma, obrigada. E acima de todos nós, tudo passa. E passar por essa terra se tornou uma aventura muito mais doce, mais complexa, mais maravilhosa e mais mais quando você chegou.

Saiba que eu te amo, você sendo bailarina ou lutadora do MMA. Saiba que eu te amo, você sendo dona de casa ou empresária, mãe de cinco ou celibatária, casada com um João ou com uma Joana, morando na cobertura ou na comunidade hare krishna. Eu te amo, se você resolver aprender todas as línguas ou só a do amor. Eu ate amo, acima e além, e a cada dia tento me preparar para te amar em cada pedacinho de como você será e se verá, e não só como eu te vejo agora.

Há brigas. E até gritos. Não era o plano, gritar, mas brigar era sim. Eu lamento. É a parte dura e uma das mais importantes, mas não é a melhor - então eu lamento. Mas tem-se que saber que não se pode colocar biquíni em pleno maio e nem ir ao parquinho às dez para as dez da noite. E que não adianta se jogar no chão por causa disso. É preciso que se aprenda, além do certo e do errado, que há coisas que simplesmente não resolvem nenhum dos nossos problemas - se jogar no chão entre elas.

E te ensinar o certo e o errado... Minha filha. Como? Se eu não acredito em erros e acertos, apesar do meu perfeccionismo, veja que coisa. Eu acredito em limite. Eu acredito no outro. E acho que isso resume o que eu tento fazer dia após dia: te dizer que você pode ser quem quiser e tomar as suas decisões como entender, desde que o outro seja respeitado, sempre, e tanto quanto você deve respeitar a si mesma. Acho que no fundo, no fundo, sou meio humanista, e isso lá é qualidade...

Filha, você me ensina a cada dia uma lição de afeição e de entrega. Eu a aprendo para praticá-la com você, quando a escola e os amigos e o balé e o namoro estiverem na minha frente, na equação. Afeição e entrega. Eu tenho que te dar espaço para crescer - mas é bem capaz que de vez em quando eu esqueça e acabe te cobrando ou até quase te sufocando, porque é isso que as mães fazem, e é amor puro. Então, tenha um pouquinho de paciência, sim? Só me lembre. Só isso.

Eu te desejo a felicidade. Eu desejo que você saiba que, no fundo, no fundo, tanto faz. Tudo tanto faz, menos o que realmente importa. E o que realmente importa, se eu tenho uma certeza nessa vida, não são coisas, mas pessoas. Escolha as suas e as ame loucamente, até doer. É o caminho mais curto para a felicidade, e onde ela é mais completa.

Minha lucidez, minha luz. Ficar velhinha para te ver ficar velhinha, também. É o meu sonho mais ambicioso.

Com todo amor que já caminhou por este mundo, e além dele,

Mamãe.

terça-feira, 27 de maio de 2014

Dos motivos pelos quais chegar em casa é o máximo

Chegar em casa é o máximo, porque ela vem correndo com os bracinhos esticados, os olhinhos arregalados, e na boca o sorriso se mistura ao mantra "mamãe, mamãe, mamãe, mamãe, mamãe!" - entoado do cômodo em questão até a porta da sala, culminando num abraço e na drástica mudança, "mamãe, vem comigo, quero te mostrar uma coisa!".

Chegar em casa é o máximo, porque às vezes tem flor, ou desenho, ou coração que a tia ajudou a recortar com marca de batom no formato de um beijo:

- Ó, um beijo. Meu, pra você!

Chegar em casa é o máximo, porque tem dengo trocado e até criança que mima a mãe:

- Mamãe, quer um copo d'água, quer? Eu pego pra você!

Como dizer que eu não quero? Capaz de tomar uns cinco litros de água, num dia.

Chegar em casa é o máximo, porque ela me ajuda a passar o creme anti-estrias na barriga.

- Conversa com o seu irmãozinho. O neném ainda não fala, mas já te escuta...
- Ô, neném... eu te amo!

Chegar em casa é o máximo. O máximo dos máximos. E pensar que daqui mais ou menos seis meses, em casa terei dois máximos me esperando. Medo até de o coração inflar de amor e alegria, feito um balão, e ficar flutuando logo acima do meu sorriso bobo.

terça-feira, 13 de maio de 2014

Eu quero brócolis!

A Ana pode comer de tudo. De tudo, a Ana pode comer. Não, eu não incentivo com "olha, esse chocolate, come um pedaço, um pedacinho só, que é uma delícia". Mas não deixo de comer na frente dela. Se ela quiser chocolate, está aqui o chocolate, mas não vá se empanturrar...

Clara sempre comeu bem, e lógico que quando ela era menor eu não comia essas gordices perto dela. Nem deixava ela comer. Ela comia legumes, cereais, carnes margas e se acabava nas frutas. E eu junto. Mas quando quis experimentar aqui ou ali, eu não tive coragem de vetar. Sou adepta do caminho do meio - pode tudo, desde que você não abuse de nada.

Mas isso de alimentação... é muito doido.

Para quem cresceu com um prato cheio de coisas saudáveis e multicolorido, vejo a Ana torcer o nariz para os doces.

- Quer um pedaço de goiabada?
- Não, eu quero queijo! Por favor.

O único porém são as balas e os pirulitos. São o lado mais criança da minha criança. Ela pede, ela fica doida se vê. Mas às vezes, no meio da bala, recebo um resto todo babado:

- Mamãe, oh... num quero.
- Por que não, Ana?
Ombrinhos pra cima e pra baixo, não quer mesmo.
- Quero lavar a mão.

E, pra coroar, a cena do último domingo...
Na mesa do almoço de Dia das Mães na casa de uma amiga querida, me pediu:

- Mamãe, quero escovar os dentes!
Alguém interfere - Mas você não vai experimentar o doce de leite?
- Escovar os dentes!
- Tem bala de coco...
- Escovar os dentes! Escovar os dentes!

E começa a chorar. Birra, pra escovar os dentes. Vou gravar, colocar no youtube, e viver dos royalties.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Terceirizando

Ontem à noite, Clara ficou na sala vendo TV enquanto eu fui descansar um pouco na cama. Lá pelas tantas, ela veio, disse que era pra me dar um beijo.

- Mamãe, eu vim te dar um beijo. Agora eu vou embora. Estou vendo a Peppa.

Feliz com o carinho, chamei quando ouvi o intervalo:

- Filha! Vem aqui me ver... Eu quero mais um beijo!

E ela veio, prontamente. Me deu um beijo, um abraço, "te amo", voltou pra ver a Peppa.

Intervalo de novo. Tentei mais uma vez:

- Ô, Ana... Ana Clara...

E ela, na mesma hora:

- Papai, a mamãe quer um beijo!

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