quinta-feira, 20 de março de 2014

Da arte de se jogar no chão e outras histórias

Porque eu dou valor às coisas boas, não significa que a vida seja só feita de coisas boas. Clara já fez birra, já me fez passar vergonha no shopping e em aniversário, já foi criança em toda sua glória - mas como não é coisa que ela faça muito ou sempre, eu nem sei direito como lidar com isso. A gente vai aprendendo (ou não, como diria Caetano).

Está numa fase de testes. "Vai você", "pega você", "não!". Tudo bem que ela usa por favor, mas não a faz menos mandona. Há que se ter jogo de cintura.

Aí cheguei em casa, ontem. Foi feriado em São José, eu não trabalho em São José, pior pra mim - melhor pra babá - salve a tia-avó que acolheu e cuidou.

- E aí, como foi o dia?
- O dia foi ótimo. Ela comeu bem, se comportou bem... - e num fio de voz, que se a criança escutar, estraga - não fez nenhuma birra...
- Oi, filha!
- Oi, mamãe! A mamãe chegou! A minha mamãe chegou!
- Como foi seu dia?
- Bom, obrigada.

Fomos pra cozinha, conversando, minha tia arrumando janta. Cacá ficou na sala, brincando, dançando, bagunçando tudo pelo chão (haja chão pra espalhar coisa. Tem mais coisa que chão?).
Volto, dou uma olhada nela. Tudo ok.
Volto de novo, depois de um tempo. Tudo ok, ainda.
Mais uma espiadela, só de leve. Continua tudo 100%.

- Ô, mamãe!
- Oi, boneca.
- Você vem ficá aqui, migo? Por favor?
- Já venho, filha. Estou ajudando a Dedé...
- Ah, pena... Eu vou.

E ela vem pra cozinha, carregada dos livrinhos.

- Leva os livros pra sala, filha, que aqui não é lugar.

E ela leva.

Cadê o neném? Oras, mas se já faz tempo que eu sei que não tem neném, mais, tem menininha, só, por que estou surpresa?
Mas cadê o neném? Fica sozinha. Se vira. Argumenta. "Só um pouquinho, só um pouquinho...". Entende. E daí que tem birra, de vez em quando? Ontem eu fiquei esperando a birra aparecer, só pra ela me lembrar que a Cacá ainda é pequenininha, como ela mesma diz, mas a birra não veio. Danada.

Na ausência da birra, Cacá ficou maior. E independente. Resolvida. Eu pergunto se quer que eu dê, se quer que eu abra - "não, obrigada". Sei que hoje é outro dia, ninguém garante que hoje no chão não esteja a própria Clara - porque eu mandei guardar os livrinhos, porque eu não sentei ao seu lado -, mas é um prenúncio certo, nem prenúncio é, é anúncio, ela está crescendo. A olhos vistos. A ouvidos. A braços que carregam os muitos quilos. Ela está se desenvolvendo, que é bem mais legal que crescer.

É engraçado, isso. A criança nasce precisando da gente pra tudo. Depois começa "vou fazer o mamá sozinha", "eu pego a água!", "mamãe, eu vou lavar a minha mão, tá bom?". A gente vai percebendo que precisar, mesmo, eles não precisam da gente pra praticamente nada. Quando foi que aconteceu o inverso da equação, e eu passei a precisar dela para precisamente tudo?

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